26 de abril de 2008

«Isabelinha sem dormir»

Eram quase três da manhã e Isabelinha, virando-se de um lado para o outro na sua cama, não conseguia voltar a adormecer, incomodada por um suave ruído, descompassado e irritante, que vinha do outro lado da parede.
Irritada, senta-se na cama e com o ouvido à escuta, não tão bem como quando Manelinha, sua mãe, "mete os ouvidos à escuta", tenta perceber se o rádio da cozinha tinha ficado ligado em volume mínimo.
Quase totalmente desperta julgou por fim ter descoberto: António, o hóspede, estava a chorar. A gemer, a lamentar-se, a rezar! Seja lá o que fosse aquilo.
Isabelinha, coitadinha, encheu-se de pena e teve vontade de dar dois ou três batuques na parede para lhe dar a entender que não estava sozinho. Não, isso seria atitude à Manelinha, mandar calar o homem com uns batuques na parede, intimidando-o.
Isabelinha, enfermeira, tão delicada e sensível teve foi vontade de bater à porta do quarto e perguntar se estava tudo bem, mas a sua educação, a sua boa educação, vinda não se sabe bem de onde, como comentavam as vizinhas que apreciavam os modos da menina e reviravam os olhos quando Manelinha abria a boca, a não ser que esta fosse contar alguma cusquice. Ora, a sua boa educação não a deixava ir a meio da madrugada, bater à porta do quarto de um homem que não conhece de lado nenhum.
E assim ficou Isabelinha até à hora de se levantar, perto das seis da manhã, acordada e angustiada, com a luz do candeeiro da mesinha de cabeceira acesa, a imaginar o que faria um homem chorar assim durante tantas horas.

Sem comentários: